Em um artigo publicado pelo World Economic Forum em 22 de julho de 2021, Carter Roberts, Presidente e CEO do World Wildlife Fund nos Estados Unidos e Yannick Glemarec, Diretor Executivo do Green Climate Fund falam sobre a importância das Soluções baseadas na Natureza (SbN) e no Ecossistema (Ecosystem-based Adaptation – EbA) no combate à crise climática global e recomendam três regras principais para tornar estas abordagens bem-sucedidas e duradouras.
De acordo com os autores, líderes de duas organizações com profunda experiência em financiamento e implementação de SbN e EbA, o financiamento do clima permanece como um dos pilares críticos dos esforços globais no combate à crise climática. E a necessidade de uma rápida transição econômica para um modelo resiliente ao clima com emissões líquidas zero exigirá significativamente mais investimentos em um conjunto diferente de ativos e investimentos que atendam ao imperativo humanitário de inclusão social e redução da pobreza. E afirmam:
“SbN e EbA são soluções que simultaneamente conservam, restauram ou melhoram o uso ou gestão de ecossistemas naturais, enquanto aumentam o armazenamento de carbono, evitam as emissões de gases de efeito estufa e/ou melhoram a resiliência aos impactos das mudanças climáticas. Desta forma, oferecem o maior retorno para o investimento, garantindo benefícios para o clima e para as comunidades.”
No dia 27 de maio de 2021 foi publicado o relatório State of Finance for Nature (UNEP; WEF; ELD; Vivid Economics, 2021), que aponta ser necessário um investimento total na natureza de 8,1 trilhões de dólares entre agora e 2050 para enfrentar com sucesso as crises interligadas do clima, biodiversidade e degradação da terra. Para alcançar este ideal o investimento anual deve chegar a 536 bilhões de dólares até 2050. O relatório conclui que os investimentos anuais em SbN terão que triplicar até 2030 e quadruplicar até 2050 em comparação aos investimentos atuais de 133 bilhões de dólares usando 2020 como ano base (Rukikaire; Ederer; Russo, 2021).
“A ampliação do capital privado para SbN é um dos desafios centrais dos próximos anos com foco específico em investir na natureza para apoiar o crescimento econômico sustentável no século 21.”
Encabeçam a afirmação acima Keishamaza Rukikaire (Chefe de Notícias e Mídia do UNEP), Waltraud Ederer (Conselheiro da Initiative ELD) e Amanda Russo (Chefe de Conteúdo de Mídia do World Economic Forum).
Três regras para abordagens bem-sucedidas e duradouras
Para Roberts e Glemarec (2021), para que as SbN e EbA sejam eficazes e duradouras é vital financiar e implementar da maneira certa a partir de três regras principais:
1. Todos têm um papel importante a desempenhar, tanto na concepção quanto na implementação de Soluções baseadas na Natureza e no Ecossistema. Governos nacionais e locais, comunidades locais e povos indígenas, o setor privado e a sociedade civil. Também é fundamental reconhecer as dimensões de gênero das abordagens e a contribuição das mulheres para a preservação e restauração dos ecossistemas. Seguindo este princípio, quaisquer benefícios – financeiros ou outros – derivados da iniciativa devem ser compartilhados de forma equitativa com as pessoas da comunidade local da área afetada que são os aliados mais importantes para o manejo sustentável de longo prazo.
2. Soluções baseadas na Natureza e no Ecossistema devem ser projetadas usando a melhor metodologia científica e serem devidamente acompanhadas para garantir a obtenção de benefícios reais para o clima, a natureza e as pessoas. Os primeiros passos devem incluir a identificação das causas locais e regionais da perda da natureza, o desenvolvimento de uma compreensão mais profunda dos impactos climáticos locais esperados e a avaliação das compensações das diferentes práticas de gestão de recursos para maximizar os resultados positivos. Com base nessa avaliação, as metas devem ser estabelecidas, as intervenções necessárias identificadas e orçadas e cronogramas claros estabelecidos para a ação de todos os parceiros. Finalmente, um plano deve ser desenvolvido para medir o progresso e avaliar a necessidade de ação adaptativa.
3. Deve haver uma estratégia para garantir o sucesso de longo prazo dos investimentos. Isso requer uma visão clara para garantir um financiamento estável e sustentável e uma gestão local.
Investir de forma mais inteligente: re-imaginar, recriar, restaurar
De acordo com o relatório State of Finance for Nature (Rukikaire; Ederer; Russo, 2021), soluções baseadas em florestas por si só, incluindo o manejo, conservação e restauração de florestas, exigirão 203 bilhões de dólares em despesas anuais totais em todo o mundo. Isso equivale a pouco mais de 25 dólares por ano para cada cidadão em 2021. O que poderia resultar em aumentos de área florestal e agroflorestal (combinação de produção de alimentos e cultivo de árvores) em aproximadamente 300 milhões de hectares até 2050, em relação a 2020.
O recente relatório da McKinsey que trata do retorno do investimento em proteger a natureza em comparação com outras abordagens traz como um dos exemplos o papel dos recifes de coral na redução da energia das ondas e proteção dos danos extremos das tempestades de quase 200 milhões de pessoas na Índia, Indonésia, Filipinas e outros lugares. Conforme o relatório, a proteção e restauração destes ecossistemas é 15 vezes mais econômica em comparação à alternativa tecnológica de construção de barreiras artificiais contra tempestades.
A ONU afirma que para cada 1 dólar investido na restauração de ecossistemas o retorno é de 10 a 15 dólares. Investir na natureza é um negócio lucrativo para as pessoas, o meio ambiente e as futuras gerações.
No Acordo de Paris de 2015, líderes de 192 nações se comprometeram a limitar o aumento das temperaturas médias globais desde os níveis pré-industriais em no máximo 2 °C, o que seria a barreira limite de um colapso ambiental global irreversível. De acordo com Roberts e Glemarec (2021), as abordagens baseadas na natureza e em ecossistemas tem potencial de fornecer cerca de 30% da mitigação climática global necessária para cumprir as metas do Acordo de Paris. Entretanto, para atingir estes objetivos cada país precisará seguir um único caminho único e muitos precisarão de apoio financeiro para implantar novas tecnologias, proteger os depósitos naturais de carbono e ajudar as comunidades a se adaptarem às mudanças que já estão em andamento.
Embora a crise climática ainda não tenha ganhado a atenção necessária em boa parte das agendas brasileiras, nos últimos anos o Brasil tem presenciado eventos climáticos extremamente desproporcionais às condições normais, como mostra a reportagem de Gabriel Dantas Romano publicada pelo jornal Le Monde Diplomatique, em 23 de julho de 2021. Para diversos especialistas no assunto, não é novidade que as atividades humanas de desmatamento e mudança do uso da terra nos países em desenvolvimento intensificam os efeitos da mudança do clima e a perda de biodiversidade e estão relacionadas também à atual crise hídrica vivenciada no Brasil.
Vamos investir em Soluções baseadas na Natureza e no Ecossistema?
Referências Bibliográficas McKinsey & Company. Valuing nature conservation. A methodology for quantifying the benefits of protecting the planet’s natural capital. September 22, 2020. ROBERTS, Carter & GLEMAREC Yannick. 3 Rules for Successfully Solving the Climate Crisis. World Economic Forum. July 22, 2021. ROMANO; Gabriel Dantas. Brasil vive catástrofe climática em completo silêncio. Le Monde Diplomatic. Acervo Online|Brasil. 23 de julho de 2021. RUKIKAIRE, Keishamaza; EDERER, Waltraud; RUSSO, Amanda. World needs USD 8.1 trillion investment in nature by 2050 to tackle triple planetary crisis. United Nations Environment Programme – UNEP. May 27, 2021. United Nations Environment Programme – UNEP. ONU - Programa para o Meio Ambiente. Instagram <@unep_pt>. 28 de julho de 2021.
Texto por Maitê Bueno Pinheiro - Comunicadora Social da Phytorestore Brasil. Professora Universitária, Bióloga, Especialista em Química Ambiental e Mestra em Ciências pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP).